PNE: organizador das reformas neoliberais em curso no Brasil

Está tramitando no Congresso Nacional o projeto nº 8035, o novo Plano Nacional da Educação para os próximos 10 anos. O Plano anterior, gestado no governo Fernando Henrique (2001/2010) não atingiu seus objetivos e, mais que isso, demonstrou que a velha fórmula de elaboração de políticas educacionais sem ouvir a comunidade escolar e sem resolver o grande problema do financiamento, piorou a qualidade da educação brasileira. A taxa de analfabetismo segue muito alta - 9,7%; a evasão escolar aumentou; o número de jovens no ensino superior segue sendo muito baixo - 14,4%; o ensino superior pago cresceu duas vezes mais que o público. Isto para citar alguns exemplos, já que 2/3 das metas não foram cumpridas, inclusive a destinação de 7% do PIB para a educação. Passados 10 anos, não chegamos nem ao aumento de 1% do que era gasto no início da década passada, mesmo com anos de crescimento econômico o que, entretanto, não foi revertido em aumento de investimentos na educação. Hoje gastamos 4% do PIB na educação básica e 0,7% no Ensino superior. Iniciamos a nova década amargando mais de 50% de analfabetos funcionais no país.

  O financiamento proposto não é o suficiente: Defendemos 10% do PIB

O projeto propõe 7% do PIB até 2020. Como poderemos resolver os problemas de sucateamento da escola pública por tantos anos e cumprir metas de ampliação da oferta e melhorias da qualidade se não temos recursos suficientes? Esta meta, juntamente com a questão salarial dos professores (já que excluiu os funcionários de escolas neste item), são as metas que têm o prazo mais longo para serem cumpridas: “Meta 17: Valorizar o magistério público da educação básica a fim de aproximar o rendimento médio do profissional do magistério com mais de 11 anos de escolaridade do rendimento médio dos demais profissionais com escolaridade equivalente.” Concretamente o que significa isso? Se observarmos que o Piso Nacional, desde que foi criado pelo governo, já sofreu uma redução de R$ 400,00, devemos analisar que esta meta não diz nada.

  O novo PNE avança na privatização da educação brasileira

A fórmula encontrada é o avanço da privatização com as chamadas parcerias público-privadas. Assim diversas empresas receberão “certificado de entidade beneficente de assistência social” para atuarem nesse setor. Desde o atendimento de crianças que necessitam de creches até no ensino médio e no ensino superior. A proposta para atender as metas de ampliação da oferta passa pelo atendimento privado, fora e dentro das escolas. Por exemplo, na proposta de escola integral, a ampliação da jornada escolar se dará pelos convênios entre as escolas e entidades privadas. Não há nenhum plano de investimento para a ampliação da estrutura escolar, pois como já foi dito, o governo não tem um plano de investimento que garanta a solução dos grandes problemas educacionais. Ao mesmo tempo, segue a sangria de dinheiro público para as empresas que cada vez mais, enchem os olhos para esse grande “mercado educacional”. São “pacotes educacionais” oferecidos para as escolas, desde projetos, cartilhas, uso do espaço físico das escolas, incluindo o próprio método pedagógico que os professores devem aplicar. As escolas devem funcionar segundo o modelo proposto pelo Banco Mundial “É preciso considerar o exemplo da gestão do setor público (...) a atuação do banco nessa área foi marcante no Brasil, onde está trabalhando com diversos estados em operações avançadas de larga escala de gestão orientada para resultados”. Estratégia de Parceria com o Brasil 2008-2011-relatório N.42677-BR. A proposta é trabalhar com metas. E isso se dá através do PAR – Plano de ações Articuladas O que é o PAR? - É um contrato assinado entre os municípios, estados com o MEC. É através deste contrato que o governo impõe a aplicação das metas. Trata desde a gestão educacional até o desenvolvimento de recursos pedagógicos. O PAR já está sendo aplicado e tomará novo impulso se for aprovado o PNE, esvaziando a autonomia pedagógica, administrativa da escola e descontextualizando-a. Fim da eleição de diretores Para aplicar a Gestão de Resultados, a Meta 19 estabelece a volta do diretor biônico. Vejamos: “Garantir, mediante lei específica aprovada no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, a nomeação comissionada de diretores de escola vinculada a critérios de mérito e desempenho e à participação da comunidade escolar”. E vai mais além: No ponto 19.1 fala em priorizar o repasse de transferências voluntárias para os estados e municípios que tenham aprovada lei específica prevendo a observância de critérios técnicos de mérito e desempenho e à participação escolar. Ou seja, a meritocracia. Sobre o item da participação escolar só pode ser demagogia, pois se o governo nomeia o diretor e este ainda tem que cumprir o contrato de gestão, de que maneira podemos praticar a democracia na escola? Nos parece que o município de Canoas, e devemos lembrar do governo Yeda, estão em consonância com as políticas nacionais propostas.

  Novo tipo de professor: o aplicador das metas 

Existe uma política de desvalorização do professor que culpabiliza-o pela falta de qualidade no ensino. É este o objetivo da Meritocracia. Mas há um aspecto que devemos observar que diz respeito ao controle do conhecimento produzido e do tipo de cidadão que se quer formar e para isso o tipo de professor que os governos querem ter. Fernando Haddad fala do despreparo dos professores e uma das medidas que propõe é reformular os currículos dos cursos de licenciaturas. Em uma de suas entrevistas, entre tantas, para citar a de 17/03/2009 (site educarparacrescer.abril.com.br), expressa seus objetivos: “No caso da Pedagogia, a questão é contrabalançar melhor o espaço que ocupam disciplinas clássicas – como Sociologia, Filosofia, Psicologia e história da Educação – com as ligadas à didática. O fato é que é preciso incluir as competências básicas sobre o dia-a-dia da sala de aula, que sempre foram uma característica do curso Normal. Ou ainda, nessa mesma entrevista “Nossa meta é alinhar o que está sendo ensinado e o que está sendo avaliado”. Esta visão expressa que a formação inicial dos professores deve ter como objetivo o trabalho, no seu aspecto meramente técnico. É a volta do tecnicismo na educação. E essa visão também aparece na formação dos alunos. É o esvaziamento de uma formação integral que possibilite o aspecto mais político da educação, na formação de uma sociedade que possa falar sobre si mesma. Assim a meta 15.7 expressa essa política: “Promover a reforma curricular dos cursos de licenciatura de forma a assegurar o foco no aprendizado do estudante, dividindo a carga horária em formação geral, formação na área do saber e didática específica”. Ao mesmo tempo em que o governo implementa suas reformas curriculares, visando um conhecimento oficial, estabelece para isso, vários itens que se referem a medidas de controle: avaliações, regulações, supervisões, por exemplo, o item 15.8. Também é mantido o atual sistema de Avaliação Externa que mede a qualidade do ensino gerando o IDEB. Ainda como política de formação de professores, propõe o Ensino à distância e a formação continuada. Ou seja, a qualidade de nossa formação está seriamente comprometida. Também é importante registrar que 54% dos professores atuais são formados pelo ensino privado
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  Jornada de trabalho em uma única escala: uma reivindicação revertida para mais um ataque

Na meta 17.3 consta a implementação de planos de carreira com implementação gradual da jornada de trabalho cumprida em um único estabelecimento escolar. Aqui mais uma vez o governo pega uma reivindicação dos professores e a transforma numa arma contra eles, pois não estabelece o respectivo incentivo salarial. Sobre isso havia até o início deste ano no Congresso Nacional o projeto de lei 1592/2003 do ex-deputado Carlos Abicalil,(presidente da CNTE 1995/2002) projeto este apoiado pela CNTE. Tratava das Diretrizes dos Planos de Carreira. Este propunha que a relação entre os vencimentos iniciais dos profissionais habilitados em nível médio e os de nível superior, tivesse uma diferença de no mínimo 20%, e no máximo 40%. Isto está expresso no inciso VII do art.3. É muito pouco. Propunha também, no inciso IX, o percentual de pagamento para a Jornada de trabalho em uma única escola, “nunca inferior a 20% do vencimento básico”. Com os atuais salários não podemos aceitar que nos obriguem a trabalhar numa única escola. Ainda bem que esse projeto foi arquivado no início deste ano, já que Carlos Abicalil foi ocupar um cargo no MEC. Mas o que dizer da CNTE? Para podermos analisar a atual política para o Ensino Superior vamos ver sobre o seu principal projeto: o REUNI. Proposta que se mantém no Projeto de Lei em debate neste texto. O ensino superior “pesa” no Orçamento federal menos que 1%. O governo aumentou o número de vagas superlotando as aulas e forçando os professores a aprovarem 90% dos alunos. O resultado é visível: queda na qualidade de ensino, transformando as Universidades em Colegiões de 3ºgrau. Na verdade, a expansão do ensino superior, tem como pilar o Ensino à distância. Na rede pública cresceu 10000%. Milhares de professores e doutores estão sendo formados sem entrarem numa sala de aula. São os profissionais de amanhã. É isto que expressa a Meta14.

  Sobre a CONAE

A ANEL – Associação Nacional do Estudantes Livres analisa a Conferência Nacional de Educação ocorrida em Brasília em 2010, como uma conferência atrelada ao governo. Esta foi organizada e controlada pelo MEC. Reuniu representantes dos empresários, do governo e dos trabalhadores. A Confederação Nacional dos empresários e a Conferência Nacional da Indústria fizeram parte da comissão Organizadora da CONAE, certamente esses sindicatos não tem nenhum interesse comum com os estudantes e com a defesa da escola pública. Mesmo assim o governo não cumpriu nem as deliberações da conferência controlada por ele. A destinação de 10% do PIB para educação, aprovada pela CONAE foi solenemente ignorada. Ao mesmo tempo, que propagandeia ter construído uma Conferência com os setores da educação procurando parecer democrático. Portanto o PNE do Governo Lula-Dilma é mais um projeto que visa lançar sobre as costas do trabalhador em educação a crise história de falta de investimento por qual passa o setor. Para isso ameaça retirar direitos como os nossos planos de carreira, instituindo a gestão por resultados e a meritocracia, eliminando a eleição direta para os nossos próprios diretores, não garante uma política concreta de reajuste, sequer o Piso, superlota as salas aumentando a carga do trabalho na categoria, e dos 10% esperados não temos a garantia de que os 7% propostos serão investidos realmente. A luta pela valorização das nossas conquistas, a manutenção do nosso plano de carreira e a própria existência de democracia nas escolas passa por nos somarmos também nessa mobilização nacional contra o PNE, pois com base nesse precedente os governos estaduais virão com mais força para cima de nossas conquistas o que já temos visto desde o inicio do ano com o governo Tarso. 10% do PIB para a educação já! Não ao PNE do Governo Lutar para mantermos nosso plano de carreira e por um Piso Nacional com critério de reajuste que garanta valorização efetiva!


*MARIA LUIZA DE CASTRO SMIELEWSKI é professora e diretora do 38° Núcleo do CPERS/Sindicato

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